Turnos e Bandidos

Recentemente eu comecei a narrar uma aventura para os meus alunos e alguns colegas professores na escola. Estamos jogando pontualmente uma vez a cada 15 dias e neste sábado teremos a segunda aventura da campanha. O jogo gira em torno do mote de sobrevivência. A história do cenário versa que no passado o mundo era extremamente avançado com magia incrivelmente popularizada e que fazia a população ter uma qualidade de vida extrema.  Mais ou menos 200 anos atrás uma grande Guerra destruiu o mundo e matou cerca de três quartos da população. Um evento traumático chamado de guerra dos cogumelos. O mundo passou de super magia para praticamente baixa idade média.  

Os personagens jogadores fazem parte de uma comunidade e precisam fazer com que esta comunidade cresça e se desenvolva a fim de garantir também a sobrevivência deles. Não é mesmo aquele joguinho de dungeons and dragons do fim de semana onde você entra na Dungeon, mata o monstro, pega o tesouro e volta para a cidade para gastar tudo em poções e itens mágicos. A decisão que os jogadores têm em direcionar os recursos da cidade pode fazer toda a diferença no futuro próximo: investir no treinamento da população para que todos possam se defender no caso de uma invasão, mesmo sem estarem devidamente equipados ou, equipar e treinar muito bem um pequeno grupo para que ele seja capaz de defender a cidade no caso da mesma invasão? 

A aventura deste sábado vai falar sobre uma das ameaças deste mundo. Os bandidos que assolam as pequenas comunidades. Neste caso, um grupo de 25 bandidos está sediado numa antiga base de comunicações chamada Forte Olívia. É claro que a base não tem mais o seu equipamento de telecomunicação e vigilância, mas a estrutura é subterrânea e serve muito bem de abrigo para bandidos não apenas se protegerem mas também guardarem o seu butim. 

Na aventura passada os jogadores enfrentaram quatro desses bandidos e acabaram com eles sem grandes dificuldades. Também pudera, pegaram os quatro de surpresa, quando estavam comemorando uma incursão bem sucedida!

O problema é a aventura deste sábado. Eu não queria fazer uma Dungeon genérica em que cada sala tem um monte de criaturas só esperando para pular em cima dos jogadores. Eu queria alguma coisa orgânica, alguma coisa que fizesse sentido do ponto de vista da organização vital. Então eu pensei como é que essa líder meio orc organiza seus soldados para manter a sua fortaleza bem protegida e ao mesmo tempo controlar toda a região. 

E devo dizer que foi um desafio muito mais interessante e divertido do que montar as fichas dos npcs ou sair distribuindo armadilhas pelas salas. 

A primeira coisa que eu fiz foi pensar como a estrutura do antigo posto de telecomunicações mágicas funcionava antes da guerra. Determinei o que havia originalmente em cada um dos seus dois pavimentos subterrâneos e suas 11 salas e só depois pensei como os bandidos teriam ocupado esse lugar. O que eles mudariam, o que deixariam para trás, o que não seria do seu interesse… Como eles dariam utilidade às antigas instalações. 

Uma vez pronta essa parte, tratei de preparar as fichas dos bandidos. E nisso a internet foi muito útil pois, de acordo com o ND criaturas, pude criar desafios interessantes sem ficar fácil demais e nem impossível ao quadrado.

Agora a parte mais desafiadora e mais divertida foi justamente pensar nos turnos em que esse pessoal estaria rodando por essa Fortaleza e pelas redondezas. E o que e quando eles fariam alguma coisa que não fosse ficar de cara feia esperando os jogadores se esgueirarem pelas sombras.  

Determinei que haveria pelo menos quatro grupos ocupando a região. O primeiro grupo ficaria na entrada da Fortaleza. Esse grupo é composto por dois bandidos experientes que fazem turnos de 8 a 10 horas como vigias, auxiliados por três recrutas que ficam dando voltas no perímetro verificando qualquer sinal de problema. Todos os bandidos carregam apitos e são treinados no uso de sinais sonoros que imitam o canto dos pássaros para se comunicarem à distância. Então basta que um apito seja usado para que todo mundo naquele local seja capaz de saber o que está acontecendo e se mobilizar na direção do problema. 

O segundo grupo fica no primeiro pavimento da Fortaleza. O grupo é composto por um Tenente que é auxiliado por seis recrutas. Eles ficam circulando pelo primeiro pavimento, fazendo tanto o serviço de guarda como pequenos trabalhos de manutenção e limpeza. Quando terminam de limpar e fazer manutenção, passam para o segundo pavimento. 

O terceiro grupo fica no segundo pavimento e é composto pela líder Orc e mais três recrutas que ela está treinando. Quando ela não está treinando esses novatos, está verificando os mapas e pensando qual o novo plano de incursão nas fazendas em volta. 

O quarto e último grupo é composto por um Tenente mais quatro bandidos experientes que ficam patrulhando as estradas e observando as fazendas em volta, alimentando a líder do grupo com informações preciosas sobre movimentação de mercadorias nas estradas controladas pelo grupo. 

Dessa forma é possível haver um rodízio das funções e todo mundo tem tempo para comer, beber, dormir e até mesmo se divertir. 

    – Mas betão, precisa mesmo desse monte de coisa só para uma aventura curtinha de d&d? – Pergunta aquele rapaz com a camiseta do Nightwish… bem, precisar não precisa mesmo não… eu poderia simplesmente ter pego uma planta genérica de qualquer lugar e sair colocando tesouros e monstros de forma aleatória. Mas eu gosto de ter um motivo para as coisas estarem do jeito que estão. Eu nunca vou me esquecer do incômodo que eu tive jogando Resident evil 2 do PlayStation 1 quando percebi que na delegacia de polícia de raccoon city, indo do subsolo até o último pavimento, não tinha um único banheiro. O que um banheiro naquele prédio mudaria na história? Absolutamente nada, com certeza. Mas garantiria um nível de verossimilhança que eu adoro sempre que assisto ou consumo algum tipo de mídia. 

Agora resta saber se os jogadores vão sobreviver aos perigos do forte Olívia e vão encontrar todas as sementes de novas aventuras que eu coloquei espalhadas por suas salas. E sim, eu prefiro fazer meus mapas à mão.