Quem joga rpg a algum temo já deve estar familiarizado com os termos e provavelmente faz pouca ou nenhuma confusão sobre o assunto. Entretanto, acredito que seja bastante válido escrever fazendo uma diferenciação mais clara sobre os dois termos que ainda hoje são confundidos. Afinal de contas você se diverte mais quando sabe do que esta falando.
Cenário e Sistema são duas coisas que se complementam no rpg. Somados com o mestre e os jogadores foram a combinação fantástica de diversão e entretenimento que estamos acostumados. Mas o como definir cada um?
Podemos dizer que cenário é algo como um gênero literário ou um meta-gênero. Ele é que pinta as cores do jogo e dita alguns limites culturais, sociais, idiomáticos e até mesmo geográficos do jogo. O cenário é enfim o pano de fundo onde as coisas acontecem. É o palco. Entre cenários famosos podemos citar os universos concebidos por autores como J.R.R. Tolkien, George Lucas, R.L. Salvatore, Helena Gomes, Marion Zimmer-Bradley, entre tantos outros.
E o que é o sistema? Sistema são as leis da física aplicadas ao cenário. É o sistema que vai fazer a espada cortar, a arma disparar, vai dizer quem sobrevive depois de cair do alto de uma montanha ou quem tem as maiores chances de enfeitiçar aquele orgro para que ele lute do nosso lado. Assim sendo, o sistema implica num conjunto de regras feitas para por limites plausíveis num jogo de rpg. As regras é que realmente diferenciam o rpg do mero faz de conta e evitam muitas discussões comuns em brincadeiras de polícia e ladrão: “ah, eu dei um tiro em você!/mas eu estava usando colete!”. Regras podem ser muitas ou poucas, simples ou complexas, mas no fim não passam de conselhos: diretrizes que você pode seguir ou não. Entre os conjuntos de regras mais conhecidos no Brasil podemos citar o Storyteller 1.0, o AD&D, o D20, o GURPS, o Daemon, o RPGQuest, o Opera… existem tantos sistemas de regras quanto aqueles dispostos a jogá-los.
“Ok, é só isso?” pergunta aquele colega que acabou de mudar a foto do avatar para uma fadinha com asas de purpurina. “Não parece ser muita coisa. Que confusão pode haver entre os dois?”
Simples: o sistema modifica o cenário e o cenário modifica o sistema. O mais comum é que o cenário modifique o sistema, criando particularidades nas regras para que reflitam, com a maior exatidão possível a vida, ou a não-vida conforme o caso, naquele cenário. Tomemos por exemplo o 3d&t. Nele uma pessoa com Força 1 (o nível mais baixo de força para personagens) é capaz de levantar 350 kg, sendo tão ou mais forte que um gorila. Já no daemon para fazer a mesma façanha eu precisaria de no mínimo Força 29. Muitas vezes mais forte que um humano comum – bem mais forte do que você que está lendo isso aqui – cuja força média esta por volta de 09-11.
E como isso afeta num cenário? Cara, se a força mínima de um cenário é altamente elevada das duas uma: o cenário é muito resistente ou seus combates são de dimensões épicas. Épicas de que tipo? Épicas do tipo, ao levar um chute você atravessa dezenas de metros até que a parede mais próxima te pare! Que dizer então de Shadowrun que tem o sistema de magias mais complicado que eu já vi ou de Legend of Five Rings que um simples golpe de espada de um bandido meia boca pode dar cabo de um personagem super poderoso? O cenário diz “faça-se a luz!” e o sistema diz “peça por favor…”
A conjugação adequada do cenário e do seu sistema é então imprescindível para um jogo divertido. Quantas vezes não somos vítimas de uma péssima conjugação destes dois elementos? Jogos cujos cenários são empolgantes e fantásticos, mas que travam na hora de executar um combate – como foi o caso da única partida de Rolemaster que eu joguei na vida, com um halfling ladino. Tendo acabado minhas balas de chumbo e não havendo nenhuma pedra de bom tamanho e peso no local, optei por carregar a minha funda com uma moeda de ouro enquanto combatíamos um urso pardo. Rolei os dados e depois de vários minutos entre as tabelas do livro o mestre decretou que o meu ataque matou o urso. O meu halfling de 1,20 m de altura e pouco mais de 30 kg matou um urso pardo de DUAS TONELADAS com uma moeda de ouro que “quebrou a bacia do urso”. Tudo bem que rpg é fantasia, mas assim também é demais.
Outros casos são de sistemas de regras bem amarrados, intuitivos e balanceados, mas que surgiram atrelados a cenários que eu realmente não gosto. É o caso do sistema daemon. Eu adoro o sistema de regras, mas só fui me interessar pelo jogo depois que surgiram os módulos de anime e supers que saíam daquela pasmaceira de “mundo habitado por criaturas malignas rastejantes negras malévolas do mal”.
Exemplos destes tipos de discrepância não faltam; na verdade abundam no meio do rpg. O verdadeiro segredo então não reside apenas em saber diferenciar o cenário do sistema, mas si fazer bom uso das duas como ferramentas adequadas à diversão.
Você pode até mesmo inovar: pegar um cenário e adaptar para o sistema quer quiser. Não é tão difícil assim, pode acreditar. Tudo o que você precisa é de um bom conhecimento de ambos. Vamos supor que você adora o cenário de Arkanun mas prefere usar como sistema de regras o GURPS. Nenhum problema aqui. Basta usar do livro de arkanum a descrição e do livro de gurps as regras.
Role os dados e divirta-se.