A pirataria moderna se refere à cópia, venda ou distribuição de material sem o pagamento dos direitos autorais, portanto, apropriação da forma anterior ou com plágio ou cópia de uma obra anterior, com infração deliberada à legislação que protege a propriedade artística ou intelectual.
A pirataria faz que a cada ano, o Brasil perca R$1 bilhão, e no mundo faz com mais de 20 milhões de pessoas não tenham trabalho. O importante que, não só no Brasil, mas em outras partes do mundo tenham uma fiscalização desses produtos rigorosa.
No Brasil a pirataria fere a licença de copyright e contra ela existe a Lei Anti-pirataria (10.695 de 01/07/2003 do Código de Processo Penal), que pune os responsáveis e dependendo dos casos a pena pode chegar a 4 (quatro) anos de reclusão de pena, e multa. Apesar disso, a pirataria é muito praticada no Brasil sendo responsável pela geração de um grande número de empregos informais. A Polícia Federal do Brasil mantém operações permanentes para coibir as diversas modalidades de pirataria.
Eu nem vou entrar no mérito da pirataria de jogos eletrônicos, roupas, remédios, produtos de modo geral. Quero trabalhar com um conceito que trás todos vocês aqui para lerem a minha página. A pirataria no ramo dos RPGs. Todo mundo sabe (ou deveria saber, não sei) que o nosso mercado de RPG é frágil como a chama de uma vela em meio a uma ventania. Por isso eu achei que seria legal pegar alguns argumentos muito usados a respeito do tema e esmiuçá-los.
Acho que o primeiro ponto a ser ressaltado e a origem da pirataria de livros de RPG no Brasil. Se remontarmos mais de vinte anos atrás, em 1987, teremos um mercado brasileiro de RPG bem diferente. Não existiam revistas de RPG (se bem que hoje temos apenas uma), nem mesmo jogos em língua portuguesa, ou mesmo editoras nacionais. O jogo era jogado por estudantes, normalmente pessoas que fizeram intercâmbio nos Estados Unidos, tiveram o contato com o jogo lá e o trouxeram para cá. Justiça seja feita não existia sequer a internet, e computador era uma coisa cara e distante da grande maioria da população. Naquele tempo, para se jogar RPG você tinha duas opções: comprar um jogo importado, caro e todo em língua estrangeira ou tirar cópia de alguém que tinha. E normalmente a segunda opção era a mais escolhida e nem sempre a mais fácil. Ainda tenho em algum lugar por aqui o meu manual de regras do D&D 1ª. Edição que saiu no Brasil pela Grow, xerocado e cheio de anotações nas margens. E que aventura era conseguir o livro! Sempre era a cópia, da cópia da cópia. A esta galera foi dado o nome geração xérox. Provavelmente vem daí a origem da pirataria nos jogos de RPG no Brasil.
Então vieram os primeiros livros de RPG em português (D&D, Gurps, Desafio dos Bandeirantes), os primeiros encontros (RPG Rio, Uspcon, Eirpg) e as primeiras editoras a lidarem com o tema (Devir, Daemon, Trama, GSA)… mas a pirataria não mudava. O argumento que a justificava era o mesmo de anos atrás, com poucas mudanças: o preço.
O argumento de quem defende a pirataria é normalmente está entre os seguintes:
– Por que pagar pelo livro se eu posso ter o mesmo em formato digital, de graça?
– Os livros são muito caros;
– As empresas ganham fortunas com o s livros. Uma cópia a mais ou a menos não vai fazer diferença;
É verdade que alguns RPGs são bem caros. Os livros básicos do D&D 4.0, o RPG mais popular do mundo (?) saem por mais ou menos R$65,00 reais cada um. Quase R$195-200 reais. Com um salário médio girando em torno de R$465,00 os livros se tornam caros mesmo. O investimento inicial para se começar a jogar pode vir a ser o maior dos empecilhos para o jogador inicial. Pelo menos é o que se pensa sem uma rápida reflexão.
Deixe-me contar uma coisa que é novidade para muita gente. RPG é supérfluo. Aquilo que excede o necessário; coisas desnecessárias. Ou seja, você não precisa do RPG para viver.
Existem RPGs econômicos, baratos e até mesmo de graça na internet. Apesar da internet hoje ser um paraíso da pirataria, ela tem um potencial infinito para manter vivo o mais obscuro dos RPGs. E com material com cessão livre de direitos qualquer um pode navegar, baixar seu RPG livre favorito, imprimir e sair jogando. Ou seja, preço não é mais um empecilho. Existem até mesmo cenários e sistemas como o Mighty Blade 2, o FUDGE Brasil, o NANORPG…
“Tudo bem”, vai argumentar alguém, “mas eu quero jogar D&D e não estou a fim de gastar 200 paus para isso”. Você não precisa. Para os que dominam inglês existe o SRD. O SRD é todo o pacote de regras que você vai precisar para jogar. Sua distribuição é absolutamente gratuita.
“Mas eu não domino inglês” argumenta com raiva o rapaz com a blusa do Linkin Park. Bom, já existe em português o SRD traduzido em português, no site do darksun brasil. Basta baixar.
Ah, você fala do 4.0? Neste caso pode aproveitas as promoções. Na Moonshadows você tem o Livro do jogador por menos de 70,00 reais.
“Puxa, mas só tem o livro básico! Eu quero suplementos!” exclama o outro rapaz, ouvindo I-pod. Existem centenas de netbooks internet à fora com regras alternativas, cenários prontos, suplementos livres e legais que você pode se utilizar.
“Caramba, seu velho! Mas não são oficiais! Eu quero jogar D&D com todos os suplementos oficiais!” esbraveja outro que os seguranças arrastam da sala. O problema todo este em querer ter e não querer pagar por isso. Você quer ter o melhor RPG do mundo, com ilustrações de alto nível, centenas de suplementos interessantes, material de jogo para a duas vidas inteiras e não quer pagar nada por isso, né? Justamente porque o melhor RPG do mundo, com ilustrações de alto nível, centenas de suplementos interessantes, material de jogo para a duas vidas inteiras custa caro né? Porque pagar se eu posso ter de graça, né?
“Mas as empresas são todas caça-níqueis com esses suplementos todos, em busca de lucro fácil” acrescenta aquela menina vestida com orelhas de Chobit, ali no canto. Existe esta impressão – que veio do movimento punk, não tenho certeza – que ter lucro é “trair o movimento”. Putz não dá para esquecer o Dado Donabela dizendo que o João Gordo traiu o movimento punk. Quer dizer que todo mundo quer música de boa qualidade, mas nenhum cantor, ou autor deveria ganhar nada por isso além de aplausos? Bom, outra novidade para muita gente aqui: aplauso não paga a gráfica e nem põe comida na mesa do autor. Uma pessoa que executa um trabalho qualquer, merece ser recompensada por isso. Você paga R$15 reais a seu cineasta favorito sempre que vai ao cinema, R$45 reais sempre que compra um novo livro do Harry Potter, ou R$20 reais sempre que dá um pulo num fast-food da vida para encher a pança. Será que o cara que criou um jogo que você provavelmente pode vir a usar o resto da vida sem ter de pagar mais nada por isso não merece um pouco seu dinheiro? Onde está escrito que o lucro foi proibido a quem trabalha com RPG?
Eu conheço gente pra caramba que adoraria trabalhar num a loja de RPG ou numa editora de RPG. Entretanto, lojas e editoras tem um potencial financeiro mínimo. Por que? Em boa parte por conta da pirataria. Não existem dados concretos sobre isso, mas um dos editores da Devir me disse, em certa ocasião, que um dos motivos para que “Wraith: the oblivion”, um dos jogos que compõe o mundo das trevas jamais viu a luz do sol no Brasil justamente por conta de uma tradução porca que rolava pela internet. “O jogo já venderia pouco, logo seria muito caro publica-lo. Agora com essa cópia, perdemos perto de 60% dos que comprariam efetivamente o livro” disse ele na Bienal.
A situação é mais ou menos como num mercado em que é proibido que as pessoas degustem os alimentos na loja. Sabendo que nem todos os clientes vão respeitar esta norma, o mercado investe em câmeras e seguranças para evitar isso. Mesmo assim ainda existem aqueles clientes descuidistas que conseguem abrir um pacote de fritas, comer dois chips e estragar o saco inteiro, colocando-o por trás das caixas de leite. Some os custos das câmeras, da contratação dos seguranças e do prejuízo do produto estragado e você vai saber porque as coisas custam tão caro. Os custos para evitar o roubo encarecem o produto.
É a mesma coisa no RPG. Um livro a menos vendido, numa tiragem de mil exemplares se uma editora pequena faz diferença sim. Vide editoras que já fecharam as portas porque não agüentaram o rojão. A solução é insalubre para todos: aumenta-se o preço para cobrir os prejuízos da cópia pirata, o que acaba gerando mais pessoas que acham o produto caro e que vão em busca da cópia alternativa. Um ciclo vicioso difícil de quebrar.
“É esperitinho? E o meu caso…”, pergunta um senhor gorducho, meio careca e com uma camiseta do filme Godzila versus King Kong, “Eu gosto de Boot Hill. O livro não existe mais. É praticamente impossível achar uma cópia nos dias de hoje. Eu devo parar de jogar por causa disso?”. Bom eu nunca disse que você deveria parar de jogar. Longe disso. Se o seu livro não está mais á venda tente localizar os autores. Foi o que o pessoal de Tagmar fez. O grupo organizou-se, criou listas e com a autorização dos autores conseguiram tirar o cenário do limbo, conseguindo até uma versão impressa pela editora daemon. Outra opção seria adaptar o cenário ou o sistema para o seu gosto. Como as pessoas fizeram com adaptações, como Guerra nas Estrelas no sistema GURPS. Tente sempre um contato com o autor.
“Veja a seguinte situação” dia aquele rapaz de cabelos castanhos meio longos, com cavanhaque e barba por fazer, “Eu baixo os livros para ver se eles prestam. Se servirem eu compro. Eu é que não vou gastar 50 dólares num livro de RPG sem saber se vou gostar dele ou não. É tipo um test drive”. Tudo bem. Eu também faço test drive. Quando fui comprar meu carro fiz questão de dar umas voltas com ele para sentir o motor. Mas não quer dizer que eu fiquei com o carro em casa, certo? Neste caso eu aconselho o uso do bom senso. Quanto tempo você precisa para saber se o jogo é bom? 24 horas? 36 horas? Um ano? Sei sim, de pessoasque fazem test drive, mas na maioria dos casos os livros acabam entulhando os HDs enquanto os livros que ele compraria ficam mofando nas editoras. O motivo? O tal do preço.
Claro que algumas editoras sobreviveram bem à pirataria. Um caso conhecido é do primeiro volume do Inimigo do Mundo da Jambô. Apesar do livro se encontrar com facilidade na internet suas vendas não param de crescer. O que prova que a pirataria pode ser usada de outras formas.
Vai ter gente querendo me crucificar (não tem ainda? Virgem santíssima!), mas eu sou a favor da publicação de livros no formato mais econômico possível: em capa mole, somente com algumas ilustrações mais importantes e todo o resto em PB, e sem aquelas margens diferenciadas. Mais ou menos como os livros da daemon. Aos puristas, para os fãs hardcore a editora lançaria uma edição de colecionador no formato original e com tiragem pequena.
“Opa!” diz aquele rapaz com camisa de kung fu e cabeça raspada. “Isso não rola. Eu trabalho em editora e nenhuma delas tem cacife para duas edições um luxo e uma simples do mesmo livro. E ainda tem uma coisa: nem toda editora gringa vai deixar você publicar o RPG dela fora do formato original”. E mesmo que isso ocorra ainda vai ter gente que vai preferir o original “de grátis”. Imagine que cada livro não vendido significa que a editora tem menos lucro e assim menos chance de re-investir no cenário, seja com novos livros, novas ilustrações, novos materiais. É por isso que as vezes um livro é um sucesso, tá todo mundo jogando, mas ele não vende nada e é cancelado meses mais tarde.
Eu não quero dizer que você tem de comprar qualquer porcaria que aparece na frente. Nada disso. Antes, procure ser seletivo nas suas escolhas. Você não pode ter tudo, tenha apenas o que vai precisar. Quantas pessoas têm em seus HDs, discos rígidos, gigas e mais gigas de livros que após o download jamais foram abertos? Não seria melhor ter gasto este tempo de conexão com outra coisa mais útil?
Claro, tem gente que gosta do formato digital. É mais prático de carregar e não ocupa espaço físico na sua estante. Mas por que não optar por uma cópia legítima? Por que é caro? Existe muita coisa na vida que é cara, mas que a gente não vive sem. J
Não existe solução simples para a pirataria. Os maiores “pirateiros” são justamente pessoas com tecnologia para fazê-lo. Gente que poderia comprar com facilidade todos os livros que pirateia, mas prefere a satisfação de ter uma cópia pirata. Algo como se estivesse “burlando o sistema”. É o mesmo tipo de gente que reclama que não existem lançamentos de peso no mercado, ou que o mesmo está estagnado. Você acha mesmo que esta fazendo um grande favor á sociedade e aos jogadores menos favorecidos deixando o livro na grande rede? Cara, eles não tem computador e o tempo de lan house não rola para isso. Eles vão imprimir tudo é? Numa boa gráfica rápida o livro do jogador em inglês do D&D 4.0 sai por 120 reais. 80 se for P&B. E o livro em português sai em média por 70,00. Grade economia, hein?
Uma solução? Eu acho que apresentei várias ao longo do texto. O empréstimo de livros não é contra a lei. Pegue emprestado e leia. Comprar de segunda mão também é uma opção. Leilões, sebos e lojas de usados podem fazer maravilhas por sua coleção. Eu comprei um Rules Cyclopedia, do D&D por R$10 reais. Faça consórcios com seus amigos para comprar os livros que você quer. Cada um dá dez reais por mês e uma vez por mês vocês compram um livro de RPG de valor elevado. Daí vão fazendo caixinha uma vez por mês até que todo mundo tenha o livro. Acima de tudo use de sua consciência e aja de forma ética da forma que você gostaria que agissem com você. Existem centenas de opções à sua disposição.
Outra coisa que você pode fazer é dar suporte à sua editora favorita. Iniciativas, sites, resenhas são muito valiosas neste tipo de coisa. Se você é fã de GURPS pare de reclamar da devir, monte uma mesa de alguma coisa famosa e vá mestrar nos eventos. GURPS Sobrenatura, GURPS Avatar, GURPS a Fazenda… sei lá. Vai, monta e jogue.