Histórias com Policiais
O que os romances do gênero têm a oferecer para o jogo de mutantes e malfeitores?
Mas pode ir parando por aí seu Valberto. Essa iniciativa de vocês é algo muito legal e tal e coisa, mas você não quer mesmo me convencer de que super heróis tem a ver com séries policiais e detetives né?
Mas eu nem preciso. Basta que eu cite um nome. Batman. É, o cavaleiro das trevas em pessoa, o assim aclamado maior detetive desde Sherlock Holmes. Mas ao invés de trazer as ficas de grandes detetives vou focar em outra coisa: o que caracteriza o gênero policial, ou de detetive, ou mesmo de “romance policial”? Como podemos usar essas características á favor de construir grandes histórias na mesa de jogo? Que poderes devem ser evitados para que a investigação seja mais que um simples rolar de dados?
Que, como e onde?
Em linhas gerais, o romance policial é um tipo de narrativa que expõe uma investigação fictícia, ou seja, a superação metódica de um enigma ou a identificação de um fato ou pessoa misteriosa. Toda a narrativa policial apresenta um crime e alguém disposto a desvendá-lo, porém nem toda a narrativa em que esses elementos estão presentes pode ser considerada policial. Isto porque além da necessidade de um crime, é preciso também uma forma de articular a narrativa, de estabelecer a relação do detetive com o crime e com a narração.
Essa é uma definição importante e separa os jogos de mistério tais como os investigados por Scooby-doo e sua trupe das aventuras de Sam Spade, por exemplo.
Algumas das características mais presentes neste tipo de mídia são:
– O herói do romance, o detetive, sempre sairá vencedor, pois se o contrário acontecer, o fato será atribuído à baixa qualidade da história e, portanto, não haverá suspense, uma solução surpreendente ou uma catarse. Dizer que ele terminará triunfante não quer dizer que ele não vai sofrer durante o processo.
– Em muitos livros e romances, faz parte da trama que o detetive seja acusado do crime que ele tenta solucionar. Para provar sua inocência ele tem de capturar o verdadeiro culpado. É a única forma de provar sua inocência. De tão batida esta fórmula, ela acabou se tornando parte do nosso ideário popular.
– A polícia é inoperante, burra ou só serve para atrapalhar. E só chega quando tudo estiver resolvido. Se não houvesse detetives, o mundo seria o lugar perfeito para malfeitores. Sem Sherlock Holmes, jamais teríamos ouvido falar dos esquemas do infame mestre do crime, Dr. Moriarti. A polícia jamais dá conta do recado.
– Sempre existe um morto no romance policial. Esse cadáver existe apenas para causar sensações e dar vazão á trama seja ela pelo horror da morte ou o desejo de vingança.
– A solução do mistério deve estar evidente desde o início, para que uma releitura da obra possa mostrar ao leitor o quanto ele foi desatento. Da mesma forma o culpado deve ser um dos personagens comuns, mas gozar de certa importância e não ser um assassino profissional. Ele nunca poderá ser o detetive, e o crime deve ser cometido por razões pessoais. Isso ocorre muito em CSI – especialmente CSI Miami. Não consigo me recordar de nenhum crime que não tenha razões puramente pessoais.
– As pistas devem estar todas presentes no livro, de forma a surpreender o leitor no momento da revelação da identidade secreta do assassino.
– O romance policial também demonstra que não pode haver crime perfeito, logo, não há lugar para a impunidade, para o crime sem punição. A principal função ideológica na literatura policial é a demonstração da estranheza do crime, já que o criminoso é apresentado como um ser estranho à razão natural da ordem social.
Como podemos usar essas características à nosso favor?
A primeira coisa a ter em mente é que a história tem de ser boa. Pode ser clichê, mas tem de ser boa. Os personagens que cometeram o crime devem ter motivos reais para fazê-lo. Não basta que seja um assassinato aleatório. Ele deve ter conseqüências.
Outra coisa a ser considerada neste tipo de jogo é que alguns poderes, como leitura de mentes, pós-cognição, pré-cognição e percepção extra-sensorial podem estragar toda a história. O mestre deve proibir esses poderes ou mesmo limitá-los de forma que eles não estraguem a história.
Se a polícia é mesmo incapaz de resolver o caso, cabe aos personagens fazer isso. É um gancho e tanto e boas histórias começam assim. Imagine que os jogadores precisam da ajuda de um grande especialista numa área e este especialista é encontrado morto. Pode ser apenas mais um dificultador na história ou mesmo toda uma sub quest a ser explorada. Afinal, o bom egiptologista morreu por que estava traindo sua esposa, ou porque ele sabia sobre a antiga profecia que dava poder ao Faraó Vivo?
As pistas devem ser colocadas de forma que num primeiro momento não pareçam nada de especial. Só mais tarde, com outras pistas é que elas ganham novos vultos e dimensões. Uma de minhas aventuras favoritas é o “Assassinato em Bakersfield”, que narra a morte de três pessoas que aparentemente não tem qualquer relação entre eles, a não ser que suas mortes têm a ver com água e gelo. É uma das minhas mais clássicas aventuras, escrita quando eu ainda engatinhava na internet por volta de 1994. Não vou revelar o culpado, até por que pretendo mestrá-la qualquer dia desses, mas eu me divirto muitíssimo com os jogadores tentando solucionar os casos e descobrir a ligação entre eles.
E o culpado é…
E para terminar que tal uma lista de autores e detetives? Lei alguns deles, você vai se surpreender.
Principais autores e seus personagens
Agatha Christie – detetives Hercule Poirot, Miss Marple, Tommy e Tuppence Beresford e Mr. Quin.
Arthur Conan Doyle – detetive Sherlock Holmes.
Dashiell Hammett – detetive San Spade
Edgar Allan Poe – detetive C. Auguste Dupin
Georges Simenon – detetive comissário Jules Maigret
Maurice Leblanc – detetive Arsène Lupin, ladrão-cavalheiro
Mickey Spillane – detetive Mike Hammer
Raymond Chandler – detetive Phillip Marlowe
Rex Stout – detetive Nero Wolfe
S.S.Van Dine – detetive Philo Vance
Fernando Pessoa – detetive Abílio Quaresma
Jô Soares – delegado Mello Pimenta e detetive Machado Machado
Luiz Alfredo Garcia-Roza – delegado Espinosa
Rubem Fonseca – advogado Mandrake
Tony Bellotto – investigador Bellini