Adeus orkut

Abrindo mão do orkut.

Eu entrei no Orkut quando ainda estava na faculdade algo em torno de 2004. Era novidade, era a 1ª rede social que eu entrava e tinha como grande atrativo ter num único lugar fóruns, recados e listas de discussão.

Mas o tempo foi passando e o Orkut acabou se tornando pesado. Chato, intransigente e cheio de vírus. Nos últimos meses eu entrava como uma obrigação, como se bate cartão para trabalhar. Não tinha mais o prazer da discussão e dos amigos eu recebia apenas mensagens de vírus, ou de promoções de festas que eu não ia ou alguma felicitação de aniversário.

Seja como for, hoje tomei a decisão de dar fim a minha conta no Orkut. Mandei uma mensagem a todos os meus amigos – pelo menos eu acho que foi para todos: se você não recebeu sinta-se avisado por aqui – avisando que iria descontinuar o uso do serviço a partir de 02 de abril de 2011.

Agradeço a todos os amigos e amigas com quem mantive contato por tantos anos. Mas é a hora de mudar. Foi um prazer e vejo vocês por aí.

Segue abaixo, a mensagem que eu enviei para me despedir de todos no orkut.

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Olá amigos,

Estou descontinuando o uso do orkut. 48 horas depois do envio desta mensagem, no dia 02 de abril de 2011, eu vou excluir minha conta do orkut indefinidamente. O motivo é simples. O Orkut deixou de ser um lugar para encontrar amigos e se tornou um grande peso na minha vida. Tudo o que recebo são vírus e mensagens automáticas.
Aqueles que ainda quiserem manter algum contato comigo podem me procurar no facebook ou no e-mail valberto.filho@gmail.com.
Obrigado pela atenção.

Que monstro você disse que era?

A hora e a vez do livro dos Monstros!

Bestiário é um tipo de literatura descritiva do mundo animal, as bestas, muito comum nas classes monásticas do período medieval. Eram catálogos manuscritos realizados por monges católicos que reuniam informação sobre animais reais e fantásticos, tal como o aspecto, a aparência, o habitat em que viviam, o tipo de relação que tinham com a natureza e a sua dieta alimentar. A maioria dos bestiários foi escrita durante a baixa Idade Média, e eram acompanhados de mensagens de cunho moral.

Os bestiários eram livros alegóricos, por vezes claramente humorísticos e fantasiosos, em cuja informação não derivava de conhecimento científico ou experimental, ou de observação no terreno das criaturas que eram descritas.

Algumas das representações dos animais, como o abutre, não correspondiam à realidade da natureza. Em muitos livros clássicos como o “Bestiário de Alberden” eles se assemelham à águias. Em outros casos, as informações ali contidas serviam para fortalecer conceitos bíblicos, como é o caso do Unicórnio, que era tomado pela pureza da virgindade feminina. Uma mulher virgem era, portanto, a única forma de atraí-lo.

Para RPGistas de todos os sistemas o bestiário tem duas interpretações. Para mestres o bestiário significa “mais formas interessantes de matar os personagens dos jogadores” e para os jogadores, por sua vez, significa “novas formas de ganhar experiência”. Um item praticamente indispensável em jogos de fantasia medieval o bestiário trás consigo uma carga muito particular e interessante. Ele mostra não apenas os monstros, animais e criaturas fantásticas desde ou daquele cenário ou sistema. Ele também mostra como o povo do sistema se relaciona com ele.

Quase todo grande sistema de RPG que foi lançado no Brasil teve sua versão do livro dos monstros (menos GURPS que preferiu trazer itens sem sal como “o resgate dos retirantes” ou coisa assim). Aliás, qualquer mestre ou narrador que se preza já escreveu pelo menos 4d6 criaturas para atazanar a vida de seus jogadores.

Mas qual é o verdadeiro papel de um bestiário? Ele é realmente necessário? Como saber se não estou comprando gato por lebre?

 

Cuidado, a cá existem dragões.

Nos livros e mapas antigos, os monstros tinham um papel de apontar para o homem os perigos do desconhecido. Para um homem medieval, uma simples pantera negra era uma “fera atroz, devoradora de carne, e caçadora hostil, que se vestia com o manto da noite, camuflando-se na escuridão com sua negra pele”. O seu papel era alertar para que não se baixasse a guarda.

Bem, mas e nos mundos de fantasia? Nos mundos de fantasia os monstros são desculpas para qualquer outra cousa. Eles podem ser os vilões, ou seus asseclas; podem ser desafios a serem derrotados, tais como fossos ou montanhas; e podem, finalmente, ser apenas pano de fundo para o que quer que aconteça.

Quando se escreve um bestiário é difícil fugir do Cânone. O livro dos monstros de AD&D/D&D 3.X é o maior que eu conheço. Ali você encontra desde os míseros kobolds, passando pelos desafiadores gigantes até desafios épicos como Dragões e Tarrasques. Toda uma campanha pode girar em torno de um único monstro e suas variações. Foi o caso da minha saudosa campanha terra dos mortos (zumbis), ou Aeon (Dinossauros).

 

Você precisa mesmo desta criatura nova? (ou o truque de mudar a cor)

Se você já jogou videogame sabe de um dos truques mais comuns dos programadores: ao invés de desenhar um monstro totalmente novo eles pegam um monstro que já existe e mudam a sua cor, representando que ele é outro monstro. Assim, temos o leão da savana (cor de leão), o leão das neves (branco e tons de cinza claro), o leão do deserto (vermelho e cor de fogo), o leão gigante… e o pior é que muitos livros de criaturas se baseiam neste princípio para aumentar o número de criaturas ali dentro. Ou seja, o goblin genérico é um monstro, mas o goblin combatente é outro, enquanto que o goblin especialista é outro e assim vai. Valha-me nossa senhora das sub-raças dos elfos: um para cada terreno conhecido.

Uma coisa que os primeiros bestiários não precisavam pensar era no modelo de cadeia alimentar. Eu preciso de uma boa quantidade de alimentos disponível para alimentar uma enorme quantidade de herbívoros, que por sua vez vão ser perseguidos por uma quantidade bem menor de carnívoros predadores.

Pegue por exemplo a savana africana. É preciso que exista muito pasto e água para grandes quantidades de animais, como antílopes, por exemplo, para suportar um único clã de leões. Se existem mais leões do que antílopes, vai começar a haver um desequilíbrio natural. E este desequilíbrio pode resultar numa savana sem nenhum animal maior. E nem pense que antílopes servem apenas para justificar a presença de leões na área. Outros mamíferos herbívoros são tão ou mais perigosos que leões. Pense num elefante enfurecido ou um rinoceronte que acordou do lado errado do poço de lama e você vai ter problemas para lá de interessantes.

É uma coisa para se pensar se os monstros do livro fazem parte de algum tipo de cadeia alimentar entre caça/caçador, consumidor/produtor, ou se ele é apenas mais uma criatura com muitos pontos de vida e habilidades estranhas, feito especialmente para matar jogadores.

Pense por exemplo em algum animal do livro dos monstros. Algo pequeno, que não seja um desafio aos jogadores, mas pode ser um verdadeiro transtorno para o meio ambiente. Vamos lá: que tal ratos atrozes?

Com 5 pontos de vida, CA 15, Iniciativa +3, Mordida (Ataque +4) dano de 1d4 + doença) ele não parece muita coisa não é? Mas veja o tamanho do danado: um rato atroz pode crescer a até 1,20m de comprimento e pesar mais de 25 quilos. Agora imagine uma ninhada destes bichos rondando solta nos esgotos: não existe competição com os outros roedores e nenhum gato ou predador natural da cidade pode dar conta deles. É uma questão de tempo até que eles exaurirem todas as fontes de alimento dos lixões e dos esgotos para começarem a atacar nas zonas mais pobres da cidade. Um camponês típico tem uma média de 1d4 pontos de vida por nível, e seu bônus de ataque sucks! Quantos camponeses vão morrer vítimas destas criaturas, que foram colocadas apenas para dar um “temperinho extra” naquela aventura de nível 1? E olha que o bicho tem apenas ND 1/3!

Sei que pode ser que eu esteja exagerando, mas o equilíbrio natural é mesmo alguma coisa importante, a não ser que tudo o que você queira seja uma sucessão de combates sem sentido. Passeando pelas colinas os personagens já foram atacados por ursos atrozes, entes ferozes, elfos da floresta territoriais, serpentes constritoras, escorpiões gigantes e não encontraram ainda um maldito arbusto de cerejas para matar-lhes a fome.

 

Tipos e subtipos, mudanças de gêneros e coisas assim.

Uma das mudanças mais legais do AD&D para o 3.X é a questão do tipo de monstro. O tipo é uma espécie de pacote de características genéricas que todo monstro daquele tipo tem. Todo morto-vivo tem suas fraquezas e fortalezas que o caracterizam. Isso é bacana porque abriu a oportunidade para a criação de novos monstros, sem precisar de muito esforço e sem precisar comprar um novo livro.

Basta mudar o tipo da criatura. Anote aí uma receita para um monstro de desafio bacana, mas de ND baixo. Pegue um felino grande, aumente sua categoria de tamanho em 1 nível. Passe seu modelo para atroz. Agora adicione o modelo morto-vivo e presto! Você tem um leão atroz morto-vivo: chame-o de Grievous Lion e eis a sua nova criatura pronta para dilacerar os pontos de vida dos jogadores. Era assim que eu criava desafios para jogos como Resident Evil (d20 modern/Ação!!!) e para a minha campanha de D&D.

Entretanto alguns livros traziam monstros que eram literalmente sem pé e nem cabeça. Wemics, Otyugh, Owbear, Senmurv, Giffs e muitos outros são monstros que não deveriam ter saído da prancheta de projetos. Outros livros gastam espaço com monstros que não são monstros. Era o caso do bestiário do d20 modern que trazia entre seus desafios um gato doméstico!

 

Finalizando…

O bestiário é um livro valioso. Ele serve o mestre com informações importantes sobre as criaturas. Quanto mais fluffy for seu texto (mas sem ser prolixo), mais chances você vai ter de possuir em mãos uma boa ferramenta de trabalho.

Certa vez estávamos jogando uma aventura de AD&D em que um mago cobrava caro para que caravanas que atravessavam o deserto não fossem atacadas por Wyverns. Ele não os protegia de saqueadores ou coisas assim, mas apenas de Wyverns. O mago sabia que Wyverns tinham paixão por uma fruta local e quando alguém não pagava sua taxa de proteção ele ia a noite na caravana e borrifava a essência da fruta nas carroças. Todas as wyverns do deserto e mais algumas voaram no nosso encalço!

Se o seu cenário tem um bestiário próprio, você deve pensar seriamente em ver a roupagem que seus autores estão dando as criaturas. Pode ser uma grata surpresa como o livro de monstros do Reinos de Ferro – um dos melhores disponíveis no mercado ou o novíssimo Pathfinder Bestiary. Mas, atente se o livro é baseado em algum livro que você já tem, verifique se a compra vale mesmo à pena.

Pense a respeito do que eu disse: esses novos monstros são realmente tão necessários assim?

 

 

 

 

The Trashmaster

Meu pai sempre me ensinou a respeitar todas as pessoas, mas especialmente os lixeiros. Ele dizia que médicos e advogados eram importantes, mas se os lixeiros parassem de trabalhar, em poucos dias estaríamos afogados numa infinita montanha de lixo. Os caras trabalham limpando a merda que você faz. Como não respeitar pessoas assim?

Esta frase é a premissa para um dos mais audaciosos projetos de cinema e novas tecnologias que eu já vi. Praticamente um ato de amor do cineasta francês Mattieu Weschler, que gastou dois anos de sua vida criando o longa metragem “the trashmaster”, sobre um funcionário da limpeza pública de Nova York que nas suas horas vagas limpa as ruas da cidade da escória humana.

O filme é bem realizado, com um roteiro plausível, com bons cortes de imagem. As cenas iniciais são de longe as melhores do filme com tomadas aéreas contrastando com tomadas de solo.

O filme deixa claro os limites de um jogo como GTA. Não existem cenas de beijo e sente-se falta de mais opções para o movimento dos personagens. Entretanto o potencial do filme é incrível.

Que potencial? O fato de não se precisar mais de astros de cinema para fazer um filme. Precisamos de dubladores, mas não de atores. Um pacote de film-maker que tenha os elementos deste filme pode ser o começo para uma nova era digital de filmes, com um custo significativamente menor.

Sei que já existem fan filmes assim na internet, mas um longa metragem assim, eu nunca vi.

O filme pode ser assistido no link aqui.

 

Faça seu próprio Supernatural RPG

Como rolar aventuras de sobrenatural moderno usando aquilo que você já tem na sua casa?

 

Antes de mais nada o que é esse lance de sobrenatural moderno? Bom, é justamente o que o nome diz ou sugere. Pegar algum tema sobrenatural clássico e jogar esse material no mundo moderno, adaptando-o para a maneira como costumamos ver tudo no mundo moderno. Ainda não ficou claro? Ok, façamos assim: pegue o mito do vampiro clássico e coloque-o no mundo moderno diante de filmes de ação como Aventureiros do Bairro Proibido, Matrix e séries como La Famme Ninkita e você vai achar alguma coisa como Buffy, a Caça-vampiros. Pegue todos os monstros que fariam o seu sangue gelar em qalquer filme dos anos oitenta e noventa, adicione rock and roll e personagens “lindinhos/carismáticos” e você tem Suprenatural.

Agora que você já sabe do que estamos falando vamos para a receita. Para fazer este material estou me guiando por um dos melhores settings deste estilo. Acredito até que ele foi visionário em suas predições sobre o tema, cerca de dez anos atrás. Estou falando do cenário “shadow chasers”, contido no livro d20 modern de  Bill Slavicsek, Jeff Grubb, Rich Redman, e Charles Ryan, publicado inicialmente em 2002.

 

O que você vai precisar:

  • O seu sistema favorito – desde que ele comporte aventuras no mundo moderno.
  • Dados
  • Lista de personagens coadjuvantes
  • Uma história

 

Ajuste-se

Pense em um mundo sobrenatural moderno onde os personagens lutam contra seres sobrenaturais malignos. Coisas como vampiros e lobisomens parecem populares estes dias. Pense neles e pense em suas lendas. Como elas funcionariam hoje? Cruzes funcionariam? Balas de Prata? Um MP3 tocando Lady Gaga a todo volume espntaria um lobisomem? Vampiros podem ser mortos por uma estaca de madeira para o coração? Certifique-se que as regras sejam claras para todos. Encoraje os jogadores a fazer perguntas antes de começar a resolver os detalhes e as incoerências com as regras.

 

Faça seu próprio roteiro

Para que o seu mundo seja consistente e excitante de jogar você precisa de uma história. Você precisa de um vilão que todos adoram odiar. Crie uma história que explique porque o vilão virou o que é hoje, a origem de seus poderes, o que eles querem e quais seus planos para obter o que desejam. Pode ser que os vampiros sejam predadores da humanidade desde sempre, mas hoje eles querem apenas despertar o grande lorde adormecido dos vampiros que vai consumir toda a humanidade. Ou quem sabe eles querem apagar ou diminuir os poderes do sol, para que possam andar livremente durante o dia.

 

Quem são os personagens?

Comece trabalhando com idéias de como os personagens se meteram ou vão se meter nesta confusão toda. Estabeleça conexões entre os personagens, desde as mais óbvias (pai e mãe, irmão e irmã) até as nem tão óbvias assim… pergunte sempre: como este personagem se conecta com a história que eu quero contar?

 

Ponha reviravoltas na sua história

Seja imprevisível de tempos em tempos. Coloque mudanças que obriguem os jogadores a repensarem as ações e os destinos de seus personagens. Pense na surpresa que foi quando Darth Vader disse a Luke Skywalker: Luke, eu sou seu pai. Isso é que é reviravolta na história.

Vai ver a presença dos vampiros é algum tipo de selo que mantém a humanidade a salvo de uma invasão de demônios. Daí se c matar muitos deles, vai ter de lidar, cedo ou tarde com uma horda de demônios enlouquecidos.

 

Mantenha o ritmo.

Deixe as coisas misteriosas o bastante para que os jogadores tenham interesse em saber como as coisas vão se desenrolar, mas ao mesmo tempo não faça a sua história tão complicada que ninguém seja capaz de seguir. Pense na cagada que fizeram com séries promissoras, como Lost e Smallville e você vai saber do que estou falando. Se for complicado demais, seus jogadores vão perder o interesse.

 

Por fim…

Deixe que as ações dos jogadores e não um rolamento ruim de dados decida a história.

 

Em busca do equilíbrio

Entre o sandbox e o railroad

 

Se você acompanhou algumas das últimas postagens do blog, viu que eu comecei a dissecar alguns dos estilos mais comuns de RPG e aventuras de RPG existentes. Tratei dos prós e contras dos estilos sandbox e railroad. Acho que agora chegou a hora do arremate.

A verdade é que ninguém, ou quase ninguém consegue fazer aventuras ou estilos de jogos que são puramente uma coisa ou outra. Claro, existe a possibilidade ínfima de, em algum dia da sua vida, você tenha pego um ou outro mestre ou aventura mais ligado a um ou outro tema, mas isso é exceção á regra.

O bom equilíbrio de jogo versa justamente quando se equilibra as duas tendências dentro do conjunto que eu chamo planejamento amplo, boa bíblia do cenário, e livre-arbítrio.

O planejamento amplo indica que o mestre começa com um “rascunho” de história. Não precisa nem mesmo ser um rascunho. Pode ser uma rápida descrição do cenário, seguido de uma série de ganchos de aventura que os personagens podem escolher seguir ou não. Este primeiro momento serve para que os jogadores vislumbrem o estilo de jogo não apenas do mestre, mas deles mesmos e que também dêem uma “espiada” no que a história e as aventuras têm a oferecer. O termo amplo indica justamente que se cubram várias possibilidades de jogo e de aventuras. A idéia aqui é que tem sempre alguma coisa acontecendo em algum lugar.

A boa bíblia do cenário é justamente isso. Quando as pessoas estão escrevendo um show de TV, eles costumam escrever a “bíblia” do show. É o termo utilizado para referir-se a um livro que traz todas as informações sobre o show. É aquilo que vai e o que não vai acontecer no show, as diretrizes, o que pode e o que não vai acontecer de forma alguma. Um dos exemplos de bíblia é a do “mestres do Universo” que deixa claro que apesar de formarem um par romântico óbvio o relacionamento de Tee-la e He-man deveria ser puramente platônico.

O livre-arbítrio vem como um dos elementos mais importantes. Os jogadores têm que ter liberdade para experimentar o cenário e as situações dos jogos como acharem melhor. Mas este livre-arbítrio não significa ligar o “foda-se” e sair por aí avacalhando tudo. É saber que as escolhas que são feitas vão ter efeitos em consequencias, não apenas na vida dos personagens como na vida de todo o resto do mundo.

David Franzoni tem uma frase que quase não é creditada a ele mesmo, que reza o seguinte: “o que fazemos na vida, ecoa na eternidade”. É a mais pura verdade. O que os personagens fazem ecoa por todo o cenário. Pense nisso e bons jogos.

 

 

Itens Mágicos – use com inteligência

Itens Mágicos

 

O que é magia? A pergunta parece bem idiota, especialmente para os amigos que acompanham o blog e jogam RPG. Magia é uma parte tão comum na maioria dos jogos que fica até fácil citar os jogos e os estilos de jogos em que ela não aparece.

Entretanto o fato dela ser bastante comum não a torna facilmente compreensível. Em certos cenários é uma força caótica, incontrolável, que cobra um alto preço de seus usuários, drenando-lhes a saúde a e sanidade; em outros é apenas mais uma ferramenta dos dias atuais, quase uma ciência exata. Pode ser espalhafatosa ou discreta, com palavras ou gestos ou sem nenhuma delas. Enfim, pode-se escrever um RPG inteiro apenas com magos.

Mas uma definição bastante bacana de magia é a que eu vi numa série de livros “As aventuras do caça-feitiço”, se não me engano. Ela reza que a magia é apenas uma maneira instantânea ou pelo menos muito rápida de conseguir o que se quer. Imagino que você esta lendo este texto sentado numa cadeira em casa. Digamos que você sentiu sede e que vai até a cozinha, Abre a geladeira, pega uma garrafa, coloca a água num copo, bebe a água, coloca a garrafa de volta na geladeira, coloca o copo na pia para ser lavado mais tarde e só depois dessa maratona volta para terminar a leitura do texto. O que a magia faz segundo esta interpretação? Ela faz aparecer um copo de água ao seu lado e depois que você bebe seu conteúdo, ela faz com que o copo volte para a pia – ou para a estante, de preferência já lavado. Magia é, portanto, uma forma utilitária de conseguir o que se quer.

Tendo isso em mente fico realmente entristecido quando nas listas de itens mágicos tudo o que vejo são mais e mais maneiras de conseguir alguma vantagem direta em batalha, seja ele para ataque, dano ou efeitos a outros monstros. Não creio que exista nada errado em você ter uma espada mágica chamada Riplarann (rasga ferro) +4, lâmina afiada, veloz. Mas acho estranho que todas ou a grande maioria das listas que eu veja se refiram apenas a combate,

Mas Valberto, você pode questionar, normalmente jogos onde a magia se faz presente são de fantasia medieval. Muito desses jogos envolve um bom combate. Por que não deveria ser assim? Acredito que a pergunta não deveria ser essa. Acho que a pergunta correta seria “Por que não poderia pensar de outra forma?”

Se começarmos pensando a magia como uma forma utilitária de resolver problemas, temos itens que podem ser bem mais úteis que uma simples espada +2. Imagine um problema que pode afligir seu personagem durante o jogo e que não esteja relacionado diretamente ao combate e aí teremos alguma coisa. Que tal atravessar um rio com armadura completa?

Uma solução simples seria as botas de caminhar sobre as águas. Este item permite que o alvo possa caminhar na água como se fosse terra sólida. Vantagens óbvias.

Quer ver mais uma? Que tal uma com graduações? O anel da montaria. Este anel conjura um cavalo semi-real e translúcido, muito semelhante a um fantasma, que fica com o Personagem durante 12 horas. Os efeitos podem ser cancelados ou reativados antes do fim da magia, mas a montaria só fica presente por um período de 12 horas a cada 24 horas. A montaria só pode ser utilizada pelo conjurador ou por quem ele indicar e possui o mesmo deslocamento de um cavalo. Em +1, a montaria é capaz de andar em pântanos e lodo sem atolar, em +2, ela é capaz de andar sobre a água; em +3, ela trota sobre o gelo sem escorregar; em +4, ela é capaz de andar sobre a água e em +5, ela se torna capaz de andar sobre o ar (como se estivesse sob o efeito de Levitação).

Quando você pensar em magia e itens mágicos, pense no exemplo do copo de água. Pode ser que seja a diferença marcante na sua mesa de jogo.

 

Trilha sonora incidental de “The Good Guys”

Muita gente me diz que a internet tem tudo pronto e que você não tem que pesquisar nada. Ok. Isso pode ser verdade 90% do tempo, mas dessa vez eu tive de exercitar o meu Google-fu para conseguir esta lista.

É a lista das músicas de rock – quase todas dos anos 70-80 que aparecem incidentalmente no seriado “The good guys” Você pode assistir pelo canal FX ou pode baixar aqui enquanto o DVD com a 1ª temporada não é colocada à venda. É um dos melhores seriados de ação policial que eu já pus os olhos. Comédia, muita ação e situações completamente inverossímeis. Recordou-me de bons tempos, onde para ver um bom show de polícia você não precisava ser PhD em química como é o caso dos episódios de CSI.

Assista o seriado, corra atrás das músicas, inspire-se a fazer uma campanha nestes moldes (sugiro o d20 modern ou o storyteller).

Mercenário – parte 3

De volta ao lar

 

 

Quanto tempo fazia que eu estava longe de casa? Mais tempo do que havia me prometido o oficial do exercito que foi até a minha vila para recrutar jovens valentes para lutarem contra os terríveis bárbaros do norte. O tempo parecia voar quando estávamos em batalha, mas quando estávamos fora dela, invariavelmente viajando de um lugar para o outro, nas famosas manobras militares, ele parecia se arrastar miseravelmente. A quanto tempo estávamos em marcha e para onde? Para fazer o que? Por que? Bom, eu nem mesmo sabia.

Naquele dia de verão, quente como apenas os dias de verão podem ser, o meu velho sargento mandou chamar por mim. Especificamente por mim entre todos os homens da tropa. É claro que ele sabia dos nossos nomes e deus sabe como ele fazia para guardar o nome de cada home que já servira ao seu lado, numa memória digna do melhor dos pesquisadores. Ainda assim, que chamasse por mim, algo que nunca acontecera antes.

Entrei na sua tenda, pouco mais que alguns farrapos de lona pendendo precariamente sobre estacas de madeira verde recém-cortadas, sobre o piso lamacento da estrada. Eu parei e fiz continência. Ele me saudou brevemente e pediu que eu me aproximasse.

– Você é da região de Bree, não é? Conhece bem a região?

– Sim senhor – respondi rápido – com a palma da minha mão. Cada trilha e cada contorno do rio.

– Bem garoto, eu preciso de um mensageiro para levar esta mensagem até o alto comando que esta na sua cidade natal por uns dias. Estamos aqui – ele mostrou no mapa – Bree fica depois destas colinas, para o sul.

Casa. A simples pronúncia do nome, a possibilidade de rever minha mãe e quem sabe alguns dos meus velhos conhecidos encheu o meu peito com uma sensação de antecipação que eu não sentia a muitos anos. Me sentia como na véspera de um aniversário, observando os presentes dispersos em volta da lareira, esperando a hora da festa.

– Aqui estão as ordens. Não espero retorno delas. Se o alto comando desejar você está livre para ficar à serviço deles, o que eu duvido – ele acrescentou – tem um cavalo à sua espera.

Montei e cavalguei como um louco. Aprendera a ler mapas fazia algum tempo, mas nunca tinha lido algum com tanta informação realmente útil. Depois das colinas, como o sargento dizia, lá estava a curva do rio que levava a fazendo do velho Rockie. Era pleno verão e as macieiras exalavam o cheiro gostoso dos brotos. A fazenda, assim como a estrada estava abandonada. Ninguém nos campos, vários trechos da cerca rompidos. Abandonada. Todas as fazendas. Pensei em passar em casa, mas ela ficava mais ou norte. Tinha de passar primeiro pela cidade. Mas quem ia saber? Eu poderia simplesmente pegar alguma trilha beirado o rio e sair nos campos de trigo do velho Neil. A idéia de ver minha casa, minha mãe depois de tantos anos foi mais forte do que qualquer ordem e quando dei por mim estava passando pela velha casa da árvore.

Era o nosso forte. Eu e uns amigos o construímos para viver “grandes aventuras”. Parecia tão pequeno agora, tão diferente dos largos salões que minha memória me recordava. Tão pequeno e vazio. Apertou-me o coração o que eu vi do lado dele. O túmulo de Tim. Era um grande amigo. Morreu com o pai numa das primeiras invasões. Nunca recuperamos o corpo, mas resolvemos enterrar ali seus brinquedos favoritos para que ele pudesse brincar com eles na outra vida. A tabuleta de madeira estava seca e desgastada pelos anos. Quase não conseguia ver o que havia escrito nela. Desci do cavalo e reforcei os escritos com a minha faca. Parecia o justo a fazer.

Cavalguei até perto da minha casa. Os campos estavam igualmente abandonados. A horta repleta de ervas daninhas, com os tomateiros crescendo sem controle sobre as outras verduras. A casa não estava em melhores condições. Fora abandonada a julgar pelas condições do lugar. Será que evacuaram Bree? Onde estava a minha mãe. Vasculhei a casa em busca de alguma indicação. Nos fundos da casa, escrito em carvão sobre uma parede que um dia foi de argamassa branca estava uma mensagem de minha mãe. Não, não era dela. Minha mãe não sabia ler. Era de outra pessoa.

Querido filho. Tivemos que abandonar Bree.  A guerra se aproxima velozmente. Estamos sendo relocados para o oeste, é tudo o que eu sei. Se estiver vivo, se ler isso, venha me procurar.

No meu ombro a mochila pesou. As ordens pesavam como nunca. Era o peso do dever com o exército, com o meu país, com o meu sargento, contra o desejo da minha mãe. Talvez seu último desejo, como saber? Eu já havia contrariado seus desejos antes quando me tornei um soldado e saí de casa contra a sua vontade, sem a sua bênção. Era a hora de tomar a decisão. Ir para a cidade e entregar a carta ou deixar tudo ali, esquecer a vida de soldado e seguir para o oeste em busca de minha família. O que fazer?

Fui até a cidade e entreguei a carta com o cair da noite. Menti sobre a posição de nossa tropa e disse que estávamos a dois dias de onde realmente estávamos. Disse que precisava descansar e que precisava de roupas civis para uma outra missão. “Que missão?” recordo que alguém perguntou… Secreta, respondi enquanto selava um cavalo descansado. Numa guerra ninguém questionava a palavra de um soldado, especialmente um que servia de mensageiro.

Sai de lá em direção ao oeste, roupas civis e algumas armas de confiança comigo. Eu a encontraria, mãe, ou morreria tentando.

 

 

Sandbox: colocando um pouco de aleatoriedade no seu jogo.

Fazendo o que dá na telha

– Mas como é que nos encontramos novamente? Achei que você estivesse indo para Hokubu-shū…

– É que hoje eu acordei virado para este lado e resolvi andar nesta direção. Como um gakusei peregrino é isso que eu faço…

Tolices! Ninguém vive assim!

Este diálogo, extraído de minhas memórias de L5R exemplifica bem qual é o objetivo de um cenário Sandbox. É dar ao jogador total liberdade para fazer o que ele quiser dentro do cenário. Não existe uma história pré-determinada. Em muitos casos existe apenas um mapa ou um rascunho de mapa por onde os jogadores são convidados a passear.

Sandbox, também chamado como “Open Word” ou ainda “free-roaming” é um estilo de jogo que contrasta com o railroad. Aqui o cenário é a própria matriz geradora de aventuras. Não existe um plot definido. O mundo simplesmente está girando e os personagens estão nele. Cabe aos jogadores dizer o que querem fazer e onde querem ir. Ao mestre cabe dar vazão a esse desejo por liberdade, propiciando um “chão” que possa ser pisado pelos jogadores.

Muitas vezes o narrador precisa fazer muito trabalho pesado, criando todo um cenário antes dos jogadores passarem por ali. Podem ser verdadeiros atlas sócio-políticos sobre cada região, ou um mapa desenhado com lápis de cor no papel A4 com algumas cidades, florestas e montanhas, com pequenas anotações do tipo “Ao sul de Tanagh encontra-se a Vila e a Caverna dos Orcs, a sudoeste se encontra-se o castelo-feudo de Britoniah, a oeste a Vila dos Kobolds e os restos de metrópole élfica de Dorthonion, e um pouco ao norte, a Mina Abandonada de Carvith”. Outros preferem partir do micro para o macro, criando o mundo a medida que os jogadores avançam sobre ele. O que tem depois das montanhas do pico nebuloso? (cria a ideia) o lago da Dama do Lago, claro…

É claro que para o sucesso deste tipo de abordagem é preciso que os jogadores estejam dispostos a tomar ações mais ativas dentro das mesas de jogo. Afinal eles não devem ficar sentados o dia todo na taverna esperando que o velhinho entre porta a dentro em busca de heróis. Na pior das hipóteses os heróis é que têm de decidir sair em busca do velhinho.

Aliás é bom clarificar um termo aqui. Mesmo a palavra “herói” só existe se os jogadores assim determinarem. Não existe um limite para as escolhas dos jogadores a não ser um: as consequencias de seus atos.

 

Acho que eu vou por ali…

Criar um jogo ou aventura Sandbox não é para qualquer narrador. Você precisa ter muito jogo de cintura para criar uma história “na lata” de acordo com a vontade de explorar dos personagens. RPGs mais antigos como o D&D 1ª edição ou mesmo alguns retro-clones (Star Without Number, por exemplo) que exploram a mecânica da velha guarda (Old school) seguem esse tipo de idéia em que o mundo é criado ou desvelado à medida que ele é descoberto. Normalmente você começa com um prelúdio bem genérico sobre o universo de jogo e logo depois vem com a pergunta mágica: o que o seu personagem vai fazer?

Outro ponto forte deste tipo de cenário costuma ser a necessidade de ter um bom background dos personagens jogadores. Este background vai dar ao narrador a oportunidade de interagir mais com os personagens jogadores, fazendo com que o mundo pareça girar em torno dos personagens.

Mas até aí nada de realmente excepcional. O que diferencia mesmo o gênero é que você pode fazer o que quiser e isso, claro vai trazer consequencias. 90% dos jogos de sandbox giram em torno das consequencias das escolhas dos jogadores. Algumas delas serão bem simples, como ir para o sul ou ir para o norte, enquanto outras podem determinar todo o rumo do cenário, se não do universo conhecido!

Imagine que os jogadores têm de impedir um terrível vilão e levá-lo de volta às autoridades. Eles frustram o plano do vilão, mas na hora de capturá-lo os jogadores têm de escolher entre salvar algumas pessoas inocentes ou capturar o vilão. Que dilema!

As escolhas trazem consequencias que muitas vezes se manifestam para além da simples visão do jogo. Numa de minhas mesas, um golpe de adaga que cegou o olho de um elfo (coisa bem corriqueira), acabou desenrolando ações que convergiram para a quase aniquilação da nação dos anões!

Outro ponto é que no Sandbox a responsabilidade de criar uma boa história não repousa apenas nos ombros do narrador, embora boa parte deste fardo ainda seja dele. Se os jogadores não fizerem por merecer serem as estrelas do mundo, outros personagens irão fazê-lo. O mundo não vai esperar que OS valorosos heróis vão lá e salvem a princesa. Se os jogadores não o fizerem ou outro grupo vai lá e faz ou o universo continua girando…

 

GTA-a-like?

Uma maneira clara de entender o sandbox talvez seja com a série GTA. Você tem um cenário riquíssimo, cheio de histórias e intrigas, mas é você que decide como e quando vai fazer cada coisa. Você não precisa nem mesmo seguir a história principal: pode ficar vagando por aí, interagindo com os NPCs ou com outros personagens. Essa capacidade de liberdade, onde você não esbarra nas “paredes invisíveis” que cercam os cenários comuns é o diferencial mais fantástico que este tipo de jogo pode oferecer.

Um dos seus maiores problema sé justamente os requerimentos que se faz para poder jogar. É preciso um bom mestre se não um ótimo mestre. É preciso que se conheça os jogadores e o que eles querem. É preciso que se tenham bons personagens, com backgrounds sólidos (sólido não quer dizer completo) que contribuam para a história. É preciso que se tenha também jogadores pró-ativos, praticamente trouble-makers (cria casos, encrenqueiros).

Sem isso o jogo simplesmente pára e não funciona. É muita coisa que se precisa reunir para que as coisas comecem a fluir. Não é impossível, mas dá um trabalho dos diabos.